SOBRE A "DITADURA" DO PODER JUDICIÁRIO

Recentemente, um certo ministro escalvado assim disse:
"Eu vou repetir novamente e a OAB vai lançar outra nota contra mim falando que eu não gosto de direito de defesa. Vai dar mais uns 4 mil tweets dos meus inimigos. Então, vamos fazer a festa do Twitter e das redes sociais (...)".
Trata-se de um caso em que um advogado questionou se seu pedido de sustentação oral teria sido indeferido, ao que o ministro debochante justificou sua ironia com alguma picuinha regimental. Ora! Se está no regimento interno do Tribunal Superior Eleitoral, é claro que vale mais do que a lei processual votada pelos "representantes do povo"!

O ministro também integra o Supremo Tribunal Federal (cuja nomenclatura poderia ser alterada para Soberano Tribunal Federal, tamanho o poder que tem) - órgão que, aliás, tem enfrentado um embate sério com o Senado Federal, especialmente pela proposta de emenda à Constituição Federal que veda decisões monocráticas que sustem leis ou atos dos presidentes do Executivo e do Legislativo: a PEC 18/2021.

Decisões monocráticas são aquelas tomadas por apenas um juiz, sem participação do colegiado. Essas decisões tendem, mesmo, a ser mais subjetivas e contraditórias, já que um ministro pode estar falando junto com toda a sua carga ideológica e, até, alguma ignorância no assunto (herrar é umano).

De qualquer forma, o fato de um órgão do Poder Judiciário poder sustar, por apenas um ministro, atos do Legislativo e do Executivo, enquanto o contrário não existe (isto é, não há medida que suste decisão da corte "soberana"), já "parece" indicar uma leve distorção no famoso princípio montesquieuano da Separação dos Poderes.

A PEC, obviamente, fomentou uma bela troca de farpas entre os ministros supremos e os senadores. Gilmar Mendes e Barroso já atiraram sua verborragia jurídica como puderam. O mote é sempre a "independência do Poder Judiciário", a "separação de poderes". Nunca admitem o ativismo judicial, as decisões injustificadas, "erros" movidos por conveniências, por entendimentos subjetivos, por direcionamentos políticos.


Tudo isso suscita uma questão: existe uma "ditadura do Poder Judiciário"?

A ditadura dá a entender um poder absoluto tomado por um governo antidemocrático. Ninguém elege um ditador. Às vezes, até há uma "eleição", mas de fachada (vide República Popular - pigarreio - "Democrática" da Coreia). Pra piorar, a ditadura é vitalícia, mesmo numa - tosse, tosse - "democracia". O ditador só sai do cargo na base de um golpe de Estado, de uma renúncia... ou morrendo mesmo.

E vejam que "interessante": juizes não são eleitos e estão acobertados pela prerrogativa da vitaliciedade. Uma vez no poder... digo, no cargo... um juiz não pode ser removido até que se aposente.

Além da pomposidade da função judicante e de várias benesses (como auxílios que, somados, podem ultrapassar R$ 100 mil por mês), um juiz que vende sentenças, que abusa de poder, que recebe propinas, que impõe sua vontade valendo-se de ativismo judicial escancarado, ou, de qualquer forma, usa malignamente da máquina pública para benefício pessoal ou de amigos, raramente é punido. Quando (e se) a corregedoria competente se digna a investigar alguém, o máximo que lhe é imposto é a aposentadoria compulsória - uma pena "terrível", que obriga o magistrado corrupto a receber salário sem trabalhar.

Ainda assim, "tudo bem". Afinal, juizes não governam, não legislam e suas atuações se limitam a solucionar pendengas judiciais. Nós elegemos governantes e legisladores, pois são eles que atingem nossas esferas de liberdade. São eles que podem restringir os nossos direitos numa canetada só, correto?

Mas e quando um juiz, por mero ativismo, decide não conceder aquele direito certo ao jurisdicionado? E quando, por puro subjetivismo, um juiz ordena que um jurisdicionado faça o que, por direito, não precisaria fazer?

E quando um juiz, munido de mais "poder", ocupando a cadeira mais alta do Poder Judiciário, decide prender manifestantes que sequer vandalizaram bens no ato de 08 de janeiro do ano passado (como uma senhorinha, de 57 anos, condenada a 14 anos de prisão sem provas de participação dos tais "atos antidemocráticos")? E quando, "aparentemente" por questões ideológicas, um juiz solta um certo político acusado de corrupção em diversas instâncias do próprio Judiciário e, ainda, devolve-lhe o "direito" à candidatura, atropelando regras mais comezinhas de direito eleitoral? E quando um juiz, por "aparente" direcionamento político, susta uma norma que servia, justamente, para impedir o acesso de servidores públicos corruptos ao comando de empresas públicas (como o ataque do ministro Lewandowski à Lei das Estatais)? Não seriam, estes, casos um "pouquinho" mais amplos do que o mero dizer a lei ao caso concreto?

Rui Barbosa teria dito uma frase emblemática:


Só que não! Rui Barbosa jamais disse ou escreveu coisa semelhante. Algum desocupado atribuiu a expressão ao jurista mais famoso da história do Brasil apenas para dar mais "credibilidade" à ideia. Mas faz pensar!

Afinal, existe ou não existe uma ditadura do Poder Judiciário?

A República Federativa do Brasil conferiu, ao Judiciário, o poder de dizer a última palavra em casos sob sua análise, com a força do "trânsito em julgado". Mas isso não significa, exatamente, que este "poder" seja ditatorial. Uma ditadura pressupõe amplo controle dos destinos do Estado, com um ditador ou uma oligarquia exercendo, praticamente sozinhos, as atribuições dos três poderes da República. O Judiciário, por vezes, abusa de poder? Sim! Mas, mesmo em suas decisões mais "autoritárias", ainda não parece infligir uma ditadura. Casos de ativismos judiciais evidentes ainda são exceção... estão aumentando (especialmente pelos "exemplos perniciosos" vindos da Corte suprema), mas ainda são exceção.

A questão é que, se o tal do "sistema de freios e contrapesos" não for mais bem estruturado, o princípio da Separação de Poderes pode cambalear mais um pouco por vez. Qual Poder vai "vencer" eu não sei. Mas todos sabemos quem sempre perde: o povo.

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